Venda de
obra do MAM para criação do fundo divide opinião de órgãos de cultura
- 21/03/2018 21h07
- Rio de Janeiro
Cristina
Indio do Brasil – Repórter da Agência Brasil
O anúncio do Museu de Arte
Moderna (MAM) do Rio de Janeiro de que vai vender a pintura Nº16, do
artista plástico norte-americano Jackson Pollock, dividiu opiniões de órgãos
federais de Cultura. Para o Ministério da Cultura, museus têm autonomia para
decidir sobre a venda de seu acervo. No entanto, o Instituto Brasileiro de
Museus (Ibram) criticou a decisão e pediu a suspensão do processo. A obra faz
parte do acervo do MAM desde 1954.
Com o dinheiro da venda, o MAM
pretende criar um fundo, cujo rendimento vai garantir uma receita estável por
até 30 anos à instituição. Segundo a direção do museu, o fundo permitirá o
planejamento a curto, médio e longo prazos, sem depender de recursos obtidos
por empresas privadas, por meio da Lei Rouanet. Com o fundo, o MAM quer ainda
melhorar e atualizar as condições de suas instalações.
O presidente do museu, Carlos
Alberto Chateaubriand, disse que esta é a primeira vez que o museu vai vender
uma obra. A previsão é de que a tela assinada por Pollock seja adquirida por
cerca de US$ 25 milhões. Ele disse que a instituição ainda não enfrente
dificuldades financeiras. “Antes que a gente comece a ter realmente
dificuldades é melhor tomar uma atitude para não deixar que isso aconteça.
Temos várias responsabilidades com funcionários, manutenção de acervo”, disse à
Agência Brasil.
Ministério da Cultura
Por meio de nota, o Ministério da
Cultura disse reconhecer e valorizar a autonomia do MAM, “uma instituição
privada que presta relevantes serviços à cultura brasileira, à sociedade e ao
país”. O órgão acrescentou que, por isso, respeita e apoia a decisão da diretoria
do espaço cultural. “A venda de obras de acervo com objetivos específicos é
prática comum em museus norte-americanos e europeus e muitas vezes serve ao
objetivo de garantir a sustentabilidade financeira dessas instituições”.
O MinC afirmou que no caso do
MAM, “embora a obra seja de inquestionável relevância, sua venda, isoladamente,
mostra-se suficiente para angariar os recursos necessários à criação de um endowment
[fundo para manutenção da instituição] que assegurará a sustentabilidade do
MAM-Rio”.
Para o ministério, com a opção
pelo modelo de um fundo para a construção de uma base financeira mais sólida,
“a instituição demonstra estar olhando para o futuro, alinhando-se com as
tendências internacionais de excelência em gestão de museus”.
Com isso, no entendimento do
ministério, o museu se tornará menos vulnerável a crises e menos dependente de
doações e patrocínios, com maior estabilidade financeira e viabilidade
operacional.
“O resultado disso, no longo
prazo, será a permanência da instituição e a melhoria dos serviços que presta à
arte brasileira e ao público. A venda de uma obra assegurará a conservação
adequada e a exibição das 16 mil remanescentes, assim como o incremento da
coleção de arte brasileira. A direção do MAM-Rio tem total apoio do Ministério
da Cultura e de suas instituições”.
Ibram
Já o Instituto Brasileiro de
Museus informou, também por meio de nota, que a decisão de vender a obra foi
vista com surpresa pelo órgão. “Temos pleno conhecimento com relação às
profundas dificuldades financeiras que se apresentam aos museus brasileiros no
cenário atual e não podemos deixar de reconhecer o esforço dos gestores dessas
instituições em buscar alternativas para enfrentar este momento adverso.
Gostaríamos, no entanto, de ponderar que a preservação de seus acervos é
objetivo primordial dos museus brasileiros e imperiosa obrigatoriedade para
suas atuações”.
Segundo o Ibram, destacou que “os
preceitos éticos que norteiam a gestão dos museus acolhem a possibilidade de
venda de obras unicamente se a renda obtida for integralmente destinada à
aquisição de outras obras, dentro de uma política de aprimoramento de acervos.
No caso presente, a situação é ainda mais delicada, por tratar-se da única obra
do artista no acervo do MAM Rio”.
Com este entendimento o Ibram
pediu que o MAM não leve a venda a diante. “Solicitamos assim, respeitosamente,
a suspensão desta decisão, para que possamos pensar de forma conjunta, em
diálogo com as demais instâncias governamentais e sociedade civil, outras
soluções possíveis para os desafios atualmente enfrentados pelo MAM Rio”.
MAM
O presidente do MAM informou que,
somente de conta de energia, o MAM gasta quase R$ 130 mil por mês. Os gastos
mensais do museu, em média, alcançam, segundo Chateaubriand, entre R$ 520 mil a
R$550 mil. O MAM não conta com recursos dos governos federal ou estadual. No
que se refere à Prefeitura, nunca recebeu uma contribuição sugerida pela Lei nº
1961/93.
Segundo o presidente,
diferentemente do que ocorre nos Estados Unidos e na Europa, onde são frequentes
as doações de valores elevados para museus, e até contribuições de cidadãos
comuns, no Brasil não existe esta prática e o financiamento acaba ficando a
cargo de leis de renúncia fiscal, nos âmbitos federal, estadual e municipal.
O museu solicitou ao Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), autorização para continuar o
processo de venda. Caso a autorização seja concedida, o MAM informa que vai
disponibilizar a obra ao Ibram para que faça uma consulta aos museus
brasileiros.
Se não houver interesse de nenhum
deles, o MAM buscará, através de comissão a ser criada para este fim, casas
internacionais de leilão com amplo histórico de credibilidade, como a Sotheby’s
e a Christie's, para dar transparência a todo processo.
Iphan
O Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (Iphan) informou, no entanto, que não tem
competência legal para se manifestar sobre a venda da obra N° 16, uma
vez que sua competência se restringe a situações de venda de bens tombados e,
neste caso, nem o museu, nem seu acervo são tombados em nível federal.
“Conforme a legislação vigente no
que se refere à circulação e ao comércio de obras de arte, as competências
autorizativas do Iphan limitam-se ao universo dos bens protegidos em nível
federal para situações de exportação temporária de bens tombados e produzidos
até 1889, desde que para fins de exposições no exterior, com data definida para
retorno”, completou em resposta à Agência Brasil.
Edição: Denise
Griesinger
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